quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

A FREGUESIA DE OTA e a sua Igreja do Divino Espírito Santo

A "Corografia Portugueza" refere-se, em 1712, à freguesia de Ota nestes termos:

 "O Espírito Santo no lugar de Ota que dista uma légua da Vila de Alenquer, para o norte, é curado anexo à Igreja de S. Pedro; tem 20 vizinhos, uma grande quinta de Pedro de Figueiredo, o lugar de Aldeia com 12 vizinhos, a quinta da Torre, a quinta do Archino, do marquês de Arronches e um hospital para se recolherem os pobres".
Com algumas, ainda poucas, visitas que temos feito naquela área do concelho de Alenquer, e com informações e leituras que temos recolhido e feito, somos hoje a concluir que a quinta de Pedro Figueiredo, é a quinta de Ota, pertencente à Família dos Condes de Belmonte, cujo apelido é Figueiredo Cabral da Câmara. Quanto à quinta do Archino, é pertença da Família dos duques de Lafões.

A Igreja do Divino Espírito Santo, de Ota é um templo simples que, no entanto, reune um valioso conjunto de azulejaria do século XVII. Dispõe-se pelos silhares da nave e na capela-mór revestem as respectivas paredes. São do tipo tapete, e a Igreja ainda mais enriquecida e decorada fica com o revestimento de azulejos que se patenteia na face anterior do arco do cruzeiro. Possui uma pequena mas muito interessante pia de água benta, de traça manuelina, pelo canelado que apresenta em forma de cintura, e por cima e por baixo a pedra cinzelada forma desenhos de cunhetes triangulares ou em bico de setas. Poderá, no dizer dos autores que mencionamos na fonte de pesquisa nº 1, ser um testemunho de uma igreja ou capela outrora ali construída (tendo em conta o manuelino de 1500). É que numa parede junto às escadas de acesso ao Coro, há uma placa memorativa da reconstrução da Igreja em 1765, ou seja depois do terramoto de 1755. Essa placa faz referência aos condes de Belmonte (1813-1894). Poderemos pensar, que sendo a data de 1813, próxima, mas posterior às invasões francesas de Napoleão, que tanta destruição deixaram, por templos, casas e quintas, que bem poderá ter sucedido uma nova reabilitação do templo sob os auspícios dos condes de Belmonte. Entretanto, é certo que mais recentemente a Igreja voltou e beneficiar de obras ao nível dos tectos por iniciativa do major-capelão padre Manuel Pires de Campos, que vindo dos Açores, substituiu o tecto anterior de madeira, talvez já muito degradado, por tectos de estuque, que achamos estarem perfeitos.

Na capela-mór desta Igreja está ao centro a bonita Imagem de Nª Sª da Conceição (Padroeira de Portugal), embora o orago seja o Divino Espírito Santo. Lateralmente estão as Imagens de S. Pedro e Santo António. O tecto era, antigamente, azul e nele estava presa uma placa, que julgamos ser valiosíssima, do Espírito Santo, com a pombinha, ao centro a esfera do Mundo e de cada lado julgamos ser Cristo, feito Homem e S. Pedro. Esta placa está hoje na parede do corredor de ligação entre a sacristia e as escadas do Coro. Depois, na nave da Igreja, no seu corpo central, os altares laterais possuem: à esquerda uma invulgar, bem dimensionada, e valiosíssima, julgamos nós, uma Pietà, representando a mãe de Jesus que com o seu braço direito segura o braço direito de seu querido Filho, Cristo deitado no seu colo on sobressai fulgurantemente as chagas das mutilações nas pernas de Cristo. Do lado direito estão. o Sagrado Coração de Jesus, Nª Sª de Fátima e S. José.

Por baixo do arco do cruzeiro, no pavimento há uma laje tumular de 1567 em que o falecido ofereceu três mil reis (3.000$000) e um touro. A inscrição é sensivelmente a seguinte: " E aqvi jaz Bastiam Pis Lavrador e sva molher Ana Frs os qvaes deixaram ho Espírito Sãto por sva devaçam tres mil res e hum tovro. Esta cepvltura e pera toda sva geração. 1567 " . Fora da Igreja, junto à entrada da porta principal, há uma outra sepultura indecifrável, que se julga ser do reverendo padre J. F.co. do Rego e de 1691.

No largo circundante à Igreja, há um monumento ao 4º Conde de Belmonte e 14º Senhor de Ota, falecido em 1930, com 82 anos. É D. José Maria de Figueiredo Cabral da Câmara, proprietário que foi da Quinta de Ota e agora de seus herdeiros. A população quis testemunhar a sua gratidão e homenagem pelas virtudes e respeito desta personalidade para com as pessoas desta terra. O monumento, com espaço circular relvado e gradeado, consta de uma coluna de pedra encimada pelo seu busto em bronze, de autoria do escultor D. Agostinho de Noronha.

Voltando, agora e ainda, à história da vila de Ota, não podemos deixar de referir que a povoação é antiquíssima, porque segundo "A Monarchia Lusitana", o Papa Celestino III, confirmou, em 1195, a doação de Ota feita pelo nosso Rei D. Sancho I aos frades do mosteiro de Alcobaça. Estes frades tiveram, ainda assim, aqui em Ota, uma acção importante, em tempos em que não havia tecnologia hidráulica, porque souberam abrir extensa vala para escoamento de águas do Paul, que em anos muito invernosos, se retiam e o seu encharcamento, porventura traria ambiente pestilento, criando febres palustres, ou sezões com as quais as populações e animais muito sofriam. Parece que, de facto, o Paul e o pântano do Bunhal eram os responsáveis por doenças e vítimas nesta região. Esta extensa área da freguesia de Ota é ainda caracterizada por uma luxuriante planura verde, prados e florestas onde predomina o pinhal e o eucaliptal. Possuiu sempre, no tempo da monarquia, o privilégio de couto, ou seja de ninguém caçar dentro das matas de Ota, sem licença. Resultou disso, conjugado com as atractivas condições de isolamento pelas manchas de floresta, ser lugar propício a abrigo de ladrões e malfeitores desses tempos, chegando eles mesmos, talvez, a criar e fazer moda com o ditado popular antigo " Deus nos livre das sezões de Ota e da justiça de Alenquer ". Tinham, enfim, esses marginais medo da doença e medo da justiça que seria muito rigorosa, nessa época, pelos vistos !

Entretanto, julgamos que Ota terá beneficiado com a proximidade da estrada real entre Lisboa e Caldas da Rainha. O marco de Mala-posta atesta a circulação de diligências transportando pessoas, haveres e correio. Esse marco está situado à entrada da vila e no cruzamento com a estrada que vem de Meca e do Bairro e memoriza o envolvimento da Rainha D. Maria I, nestas obras de comunicações terrestres, sendo inspector de Obras e Estradas o conde de Valladares. É datado de 1788 e Ota constituía o fim da 1ª etapa com início no Carregado, na época em que começou a circular o comboio de Lisboa até ao Carregado. Na Ota fazia-se muda de cavalos e a entrega de correio. O edifício de estação de correio de então ou de anos posteriores, ainda existe, hoje transformado para servir de sede da Sociedade Recreativa Ota-Clube. (Uma pequena nota à parte: um outro marco de grande envergadura ainda existe, na estrada nacional, adossado à parede da quinta que está em frente à empresa Martini & Rossi, na Castanheira do Ribatejo; é desse mesmo reinado de D. Maria, mas não será tanto um marco mas antes uma grande lage de limite provincial, supomos.)

Também ficamos a saber, consultando o jornal ilustrado "A HORA" de 1934, num artigo assinado por D. Vasco da Câmara Belmonte, que à entrada ou próximo da quinta de Ota, existiu e esperamos que ainda exista um cruzeiro, em cujo local existiu antes um pedestal mandado erigir pela Rainha Santa Isabel, conforme o dizem os autores da colectânea "O Concelho de Alenquer" que referenciamos nas nossas fontes de consulta. A Rainha Santa, parece que reunia aí as crianças a quem dava doutrina da Igreja Católica e a quem a quisesse ouvir, concerteza. A cruz de pedra sobre esse pedestal foi depois construída com 93 cm, por D. José Belmonte, em 1874. E ainda somos de imaginar que o nome do lugar de Paços, possa estar de alguma maneira, relacionado e lembrado com o facto de a Rainha Santa ter tido os seus Paços, na Ota e talvez, quiçá, mesmo nos edifícios da Quinta de Ota.
 
Fontes: 1- "O Concelho de Alenquer", dos Profs:

                    António de Oliveira Melo, António Rodrigues Guapo e Padre José

                    Eduardo Ferreira Martins.
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              2- “Alenquer e o Seu Concelho”, de Guilherme João Carlos Henriques 1873.
Carlos Nogueira

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